quinta-feira, 11 de novembro de 2010

LOUISE LABÉ

Em "Debate da Loucura e do Amor", a autora explora a sensualidade, o direito ao sexo livre e à liberdade de pensar, através de metáforas e sutilezas que nos remetem a um mundo de encantos e coisas não reais. Louise, a cordoeira que devorava homens através de sonetos, depravação e máscaras, incomodou e acirrou discussões entre uma classe social que preservava o conservadorismo e promovia festas com muito cristal, fermentados e anéis de procedência cobiçada - em solo francês libertado da escuridão que iluminou a Idade Média. Seus escritos exalam orgias, desejos não realizados, inveja e traições acobertadas por cortinas de veludo e destilados de efeitos alucinógenos. Louise falava e escrevia em latim e italiano , estudou música e esgrima, um esporte praticado exclusivamente por homens - pelo menos no século dezesseis. A nova Safo, como também era chamada pelos amigos que produziam literatura, lutou por educação e pelo direito de uma mulher escolher o parceiro com o qual pretendia dividir o corpo e a cama. Pessoas como Louise, que não temem comportamentos e mentalidades rudimentares, quando morrem, ou vão para o céu ou para uma colônia onde vivem os espíritos que tentaram mudar o mundo e experimentar novos sabores.
Gurgel de Oliveira

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

DEVANEIOS - Elias Santos

DEVANEIOS - Ramiro Bernabó

Dona Joana

Dona Joana das Ervas é muito conhecida no povoado como a velhinha rezadeira. Cura espinhela caída, tosse seca e outras enfermidades que atacam as crianças e também os adultos que moram próximos e nos vilarejos distantes. As estradas são de terra batida e a vegetação é rasteira, com muitos espinhos e muitas estórias contadas e cantadas nas rodas de viola organizadas pelos moradores e os repentistas do local. O olhar de dona Joana parece água do mar. Suas retinas escondem as verdades que não podem ser pronunciadas e serão guardadas para sempre como segredos dissecados e empalhados para que não percam as suas formas. As mãos de dona Joana têm rugas, manchas e o cheiro dos corpos com os quais já caminhou pelos mundos dos mistérios que só ela conhece. Na sala da casa onde ela mora tem um altar forrado com papel e docinhos de frutas que enfeitam as imagens e revestem de alegria a auréola do anjinho de gesso. Ao lado, na parede próxima do quarto, um retrato com moldura oval vigia os corredores e a porta da rua. É a foto de dona Joana rezada pelos espíritos e abençoada pelos mensageiros do sono. Parece guardar o povoado na estampa do vestido que foi comprado na feira de todos os sábados pelo filho que sumiu quando buscava ervas na mata próxima do rio. Dizem que foi levado pela Mãe d'àgua e hoje mora numa pedra junto da cachoeira.
Gurgel de Oliveira