terça-feira, 13 de outubro de 2009

DEVANEIOS - para Luciana Accioly

Sophia observa de longe os soldados armados que invadem as ruas de uma pequena cidade em Andorra. Das montanhas a natureza presencia mais um massacre que vitimiza crianças e velhos estrangeiros. Sophia espalha os brinquedos curdos pelo imenso terreno que cerca a casa onde vivem familiares e parentes agregados. As sirenes de alerta tocam num volume aterrorizante assustando a população que ainda respira. Sophia atira poemas pela janela dos fundos da casa. Jornais com notícias africanas se espalham pelas calçadas ensanguentadas, enfeitadas pelas portas de vidro quebradas com extrema violência e sem nenhum sentido. Meninas refugiadas correm a bordo de suas bonecas de louça compradas em Praga. Carrinhos de bebê descem escadarias de madeira nobre e esfregam veludo surrado nas paredes. O silêncio que vem das padarias é constrangedor. Os pães não foram assados e os estômagos choram famintos. Andorra sofre. Sua história desce pelos esgotos e a memória da cidade vira suco. Sophia observa tudo de uma distância quase real. É o mundo se mexendo diante de montanhas brancas, engolidas pelas nuvens que maltratam o final da tarde. Sophia caminha e procura a amiguinha de escola e a encontra próxima ao boeiro central da cidade, caçando bonequinhas de louça de origem tcheca.

GURGEL DE OLIVEIRA

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