terça-feira, 7 de junho de 2011

A SENHORA DA MAGIA - DONA SINHÁ

DONA SINHÁ entende mundos e pessoas de formas diversas e esconde caminhos e encantos, por entre as linhas desenhadas nas palmas das mãos . Manipula energias só conhecidas pelos índios XAMÃS da América do Norte, para atrair espríritos que habitam dimensões não perceptíveis e só visualizadas por olhos treinados na tradição daqueles povos. Para DONA SINHÁ a intuição é uma arma com a qual podemos rabiscar e acariciar o destino, tornando o ninho da nossa alma menos vulnerável ao medo e aos ataques dos leopardos. DONA SINHÁ é feiticeira! Dedica a sua vida ao tempo real e às forças que dão cores aos sonhos das crianças cegas e estimuladas durante o sono pelos gatos de pelos claros que saltam dos travesseiros e evocam os gemidos, quase moribundos, que pingam sobre os dedos e dão forma ao semblante da morte. DONA SINHÁ faz brinquedos com a água...Molha as rugas do rosto com o choro das cachoeiras e borda os sonhos das matas com o azul quase celeste que dança no fundo do mar...

GURGEL DE OLIVEIRA

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Manoel de Azevedo Silva e Outros Encantos Possíveis



A vida nos reserva surpresas todos os dias. Nossas crenças são testadas e renovadas a cada suspiro da luz que ilumina as tardes de Outono , embaladas pela brisa e sopros de magia, como se os nossos olhos fossem acariciados por mãos divinas e preparados para um novo amanhã. Não conheci o SENHOR NENÉU, que dizia ter viajado à lua com os astronautas a bordo de um grande foguete e que o Sol era frio como blocos de gelo perdidos na imensidão do espaço. Caçador e apaixonado por aventuras de tirar o fôlego, SEU NENÉU descia o RIO PARAGUAÇU e explorava florestas em busca de onças, jacarés e aves de um exotismo tão peculiar que enchia de cores o imaginário de crianças, adultos e velhos amantes das fantasias só possíveis às pessoas que têm jardins e ternura no coração. SEU NENÉU tinha um mundo próprio , onde o Sol era inverno e a Lua um universo alcançável. Numa noite de verão, em Cruz das Almas, reencontrou Lampião, o temido cangaceiro que desafiou o fogo e fez história no SERTÃO, numa época em que um bom facão ditava as regras e calava bocas e corpos em desencanto. Hoje os dias e as noites brilham diferente. Seu NENÉU partiu para mundos distantes e já faz bastante tempo que não manda notícias. Será que está na TERRA DO NUNCA enfrentando piratas e gigantes do mar? Isso eu não sei! Mas de uma coisa eu tenho certeza: o velhinho encantado está num lugar onde os desejos e os sonhos duram para sempre e as onças, jacarés e outras caças têm o cheiro das rosas brancas e o sabor da verdadeira saudade.
Gurgel de Oliveira

sexta-feira, 25 de março de 2011

LEMBRANÇAS PARA SIMONE WEIL



O ano é mil novecentos e trinta. A China tem fome e os mandarins clamam por justiça em praças e templos tocados pelos deuses. Simone Weil corre e atormenta os corredores da Sorbone a procura da amiga, a outra Simone que, dia após dia, luta para descobrir um sentido para a vida dos homens. As noites são de chuva e as ruas são enfeitadas por pessoas com roupas sem cores, dor e ressentimentos. As causas humanitárias estampam jornais e as paredes das esquinas acolhem os protestos e o inconformismo dos estômagos quase sempre vazios. Simone Weil submete o corpo à extremas privações. A outra Simone escreve sem parar e mata a fome com brioches e poemas importados de Dublin. Artistas e prostitutas trocam afagos e marroquinos servem de molde para as intenções nem sempre reveladas dos artistas que buscam brilho e notoriedade. O tempo passa e chegam as noites de calor e bebidas de origens não conhecidas. É verão no Velho Mundo e os líderes não se entendem. As farras nos cabarés se intensificam e a arte toma rumos nunca vistos. Simone Weil grita pelas ruas inglesas e marca o corpo com sangue e trapos retirados da pele dos anjos. A outra Simone escreve sem parar e entorpece a alma, para que os sentidos do olhar não adormeçam diante do caos.
Gurgel de Oliveira

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

BUSCANDO OS SENTIDOS - PARA O ARTISTA PERFORMÁTICO ZMÁRIO

Corpos sem órgãos correm por entre muros e buscam o azul. O quarto do hospital abriga moluscos, frascos sem água, travesseiros e sonolência. O artista briga com a própria imagem e raspa os pelos próximos ao peito e distantes do umbigo. Repensar a imagem diante dos espelhos resgata dores e tosses passadas. Gripes não foram curadas e os olhos doem diante das deusas e outras entidades engessadas pelo cansaço do tempo. Escadas são dispostas no altar de talha barroca e objetos de prata que não encantam e perderam o brilho. Igrejas se desprendem dos fios que delineiam a memória e as propostas do artista. É o fim da jornada. Bonecos de plástico são mutilados e mergulhados em sangue. Cartolas e perucas enfeitam o necrotério e cobrem a tarde com as cores da morte. Em Paris, próximo da torre de ferro, um filme de Michael Derek Jarman é enterrado e padres franceses se rendem ao silêncio. Para sempre beberemos ilhas e mares. Para sempre buscaremos o sentido do azul.
Gurgel de Oliveira

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

JOHN CHEEVER


Casas de subúrbio abrigam casais que não se encontram. Acidentes em estradas americanas separam irmãos para sempre e causam sofrimento aos segredos alheios. O mundo do escritor John Cheever é permeado de realidades que não são palpáveis e nos causam estranhamento. O rádio da sala transmite ruídos dos vizinhos. Hóspedes indesejáveis aportam com malas repletas de vidas sem eixo e mapas de felicidade. Luzes apagam e acendem noites flambadas com álcool e sangue de pássaros em extinção. E os becos de Nova York amanhecem molhados com portões de ferro jogados no chão e escorados nos muros idealizados pelos grafiteiros que não dormem. Universos estranhos são comuns nas páginas manuscritas de letras recicladas e despedidas. Casacos de peles causam sensações de repulsa e virilidade, enquanto as velas se apagam e deixam as ruas da cidade idealizada pela tinta sem rosto e pálpebras. O medo se espalha no elevador e o mundo redescobre pistas de crimes e vísceras. É o amanhecer que brota da caneta quase em silêncio e reverencia a força do sol.
Gurgel de Oliveira

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

ANSELM KIEFER






Câmaras frigoríficas preservam os corpos idealizados e congelados por Anselm Kiefer , numa instalação que relembra perversão e crueldade nos campos alemães. Vagões de carga são esvaziados pelas mãos do tempo como casas judias saqueadas pela descrença e pichadas com as pinceladas da ignorância que devastou parques e condenou árvores que serviram de abrigo para vivos e mortos. A performance fotográfica impressiona pela dimensão e o conteúdo que denuncia e resgata a força das mães que perderam filhos e ganharam traumas e caixinhas de saudade. E a galeria brilha na rua que clama pelo prazer diluído na urina, fezes e esperma que brotam dos canos quebrados espalhados pelo quarteirão. É assim a arte e seus apelos estéticos intensificados pelo nosso olhar: bela e fétida!

Gurgel de Oliveira


terça-feira, 25 de janeiro de 2011

KATHERINE MANSFIELD


A menina irlandesa não identificada tem cemitérios ao redor dos olhos e contos escritos por Katherine Mansfield presos ao vestido de renda inglesa, presente do primo londrino na primavera do começo do século. A chuva cai e molha o rosto e a pele que reveste o corpo com cicatrizes e feridas de guerra que marcam as pernas e sujam as meias de lama e fragmentos de bombas. As folhas de papel se desprendem do vestido e mancham de tinta a cama adornada pelos odores de morte que vão sufocar a Europa nas próximas décadas. A menina decifra o futuro nas mãos da amiga que prepara sopa e creme de legumes. E o tempo grita aos ventos que é hora de acordar e preparar o sol para momentos felizes. Katherine escreve sobre pães e pessoas que não comem. Na Irlanda, meninas sem nomes procuram caminhos numa lista afixada no muro da escola e aguardam notícias das mães que morreram surdas, sufocadas pelas ondas do rio que corta a cidade e congela a sensação de dor que acompanha o verão.
Gurgel de Oliveira